Pesquisa cria tijolos de garrafas pet para a construção de casas

Fonte: http://www.ufpa.br

Com um mercado em crescimento acelerado nos últimos anos, as embalagens pet tomaram conta do setor de envasamento. É na forma de garrafas de refrigerante que elas são mais conhecidas, mas o polietileno tereftalato – a resina termoplástica que compõe o pet – pode ser reciclado e empregado em diferentes funções, como, por exemplo, a fabricação de cadeiras, tapetes, linhas, cordas, vassouras, escovas de dente e travesseiros.

Sempre que uma nova utilidade é encontrada para o pet, o meio ambiente agradece, afinal o mundo produz em torno de 7 milhões de toneladas ao ano desse plástico cuja expectativa é de 400 anos para se degradar em aterros sanitários. No laboratório de Engenharia Química, no Centro Tecnológico da UFPA, o recém-graduado Neílton da Silva Tapajós, descobriu mais uma nova função para as garrafas plásticas: a fabricação de tijolos para a construção civil.

O tijolo criado por Neílton foi apresentado como tese de graduação em Engenharia Química e se originou da combinação individual do pet com gesso, cimento, resina cristal e caroço moído de açaí. O melhor resultado para o objetivo proposto, a construção civil, foi alcançado na combinação com o cimento.

Não se trata de reciclagem, pois a garrafa não passa por nenhum processo termoplástico de despolimerização para retirada da resina básica do pet. Neílton trabalhou com a garrafa em estado natural, preferindo as de 600 ml por serem mais compactas e resistentes.

Embutindo três garrafas, ele montou um monobloco plástico que foi envolvido por uma camada de um centímetro e meio de cimento, dentro de uma forma de madeira. Doze horas depois, o cimento estava curado, revelando um tijolo de paredes lisas, com saliências e reentrâncias nas laterais para encaixe de outros tijolos.

Além de encontrar uma nova utilização para um resíduo gerado de forma aceleradamente grande, o tijolo pré-moldado ficou mais resistente com o monobloco em seu interior. Além disso, ao ocupar o lugar do cimento, as garrafas reduzem substancialmente a quantidade de insumo e os custos na construção civil.

O tijolo pode ser empregado na construção de paredes de casas. Ele se enquadra como bloco de vedação definido pela Associação Brasileira de Normas Técnicas, para a qual bloco de vedação é todo aquele que consegue suportar a própria carga. Não pode, porém, ser empregado como bloco estrutural, ou seja, como um pilar capaz de suportar o peso de um telhado.

Estudos correlatos realizados no Centro de Formação Tecnológica do Paraná demonstraram que o monobloco pet não sofre nenhuma dilatação no interior do tijolo mesmo quando este é colocado à prova com maçarico a 75º C, temperatura limite para a despolimerização da resina.

Outra afirmação que o recém-graduado pode fazer é quanto ao nível de ruído e calor. “A literatura afirma que o pet é uma barreira térmica. Logo, numa região quente como Belém, a parede construída com esse tipo de tijolo reduziria o calor e tornaria os cômodos da casa mais refrescantes. O sol não conseguiria propagar o calor através da parede. O mesmo é possível dizer quanto ao som”, garante.

O engenheiro químico sonha em ver sua invenção empregada na construção de casas populares para pessoas de baixa renda. De acordo com o padrão Cohab, essas habitações medem 5×5 e se constituem em uma grande sala – geralmente dividida pelo proprietário em quarto e cozinha – e banheiro. Com base nas dimensões do tijolo pré-moldado construído por ele, seriam necessários 285 tijolos para cada parede. No total, seriam utilizadas 3.420 garrafas de 600 ml, uma quantidade ínfima comparada ao montante coletado diariamente no lixão do Aurá, o depósito de lixo de Belém.

Como os tijolos foram projetados com saliências e reentrâncias para se encaixarem, a montagem da parede dispensaria cimento na liga entre eles. O resultado seria uma parede lisa que também dispensaria emboço e reboco. Uma camada de argamassa leve seria suficiente para deixar a parede em condições de receber a pintura final, afirma Neílton Tapajós.

Segundo ele, o tijolo de encaixe poderia ser uma excelente alternativa ao problema do déficit habitacional na região metropolitana de Belém, que atingiu a 117 mil casas. “Como se trata de tecnologia simples, a própria população poderia construir o tijolo, precisando tão somente de garrafas pet, cimento e a forma de madeira fácil de construir”, explica. Para agilizar a produção de tijolos em relação ao tempo de 12 horas para a cura do cimento, ele pensa numa grande forma que permita a construção de fileiras de tijolos.

Aurá – Ao realizar seu trabalho de conclusão de curso, o estudante coletou garrafas em bares e restaurantes da rodovia Augusto Montenegro. Em Belém não é feita reciclagem do pet. Catadores reúnem grandes quantidades diárias no Lixão do Aurá que são vendidas às empresas de comercialização de matéria-prima reciclável. A tonelada é vendida a R$ 250,00. Nas empresas, as garrafas são apenas compactadas para reduzir o volume da carga transportada. Nenhuma outra atividade é desenvolvida com o pet no Aurá.

O pesquisador esteve no lixão e verificou as péssimas condições habitacionais dos catadores, geralmente residindo em choupanas construídas com restos de lixo. Ele expôs a sua pesquisa e os estimulou a empregarem o tijolo em suas casas. “Eles demonstraram interesse e garantiram presença no dia da apresentação do trabalho na UFPA. Mas, infelizmente, não compareceram. Acredito que isso ocorreu por causa da distância que há entre o saber científico e a sociedade lá fora. Acho que o desnível de conhecimento gerou um certo mal estar nos catadores”, avalia Neílton.

O desapontamento do engenheiro químico não se resume a este episódio. A possibilidade de seu tijolo ficar engavetado no laboratório do curso, como muitos outros trabalhos acadêmicos, é bastante real. Ele acha que está faltando à UFPA um programa qualificado capaz de apresentar resultados de pesquisas à sociedade.

Para ele, a saída é o incremento na extensão universitária. “De nada adianta a alegação de que a universidade é carente de recursos. Somos carentes de recursos, porém de recursos financeiros, não humanos. Há uma gama enorme de profissionais aqui dentro que pode prestar serviços à comunidade, sem necessidade de gastos financeiros”, afirma.

Neílton explica que enquanto engenheiro químico, sua preocupação não se resume tão somente à obtenção do diploma e emprego numa fábrica qualquer. “Tenho que dar retorno à sociedade até porque ela investiu em mim nestes cinco anos em que passei aqui. E o retorno que posso dar é através de uma pesquisa científica fácil de ser usufruída por ela, em condições de lhe gerar renda”.

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